O Homem Vertical - A política por dentro.

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Vinicius Jobim Toquinho Miucha - Berimbau / Canto de Ossanha




Notha de roda pé sobre o pífio crescimento do PIB em 2006. O poetiinha já sabia tudo! (veja artigo abaixo)

"... o dinheiro de quem não dá
é o trabalho de quem não tem"

O Plano do Real. (texto de 2004, mas cai como luva)

"PIB tem mesmo crescimento nos primeiros mandatos de Lula e FHC"
Folha de São Paulo Online, para ver a matéria clique aqui

Que realidade é esta que tomou conta do país? Que sinistro joguete fizemos com o Deus das Coisas Escassas? Vendemos o nosso futuro por tão pouco? Eu tenho a incomoda sensação que caímos numa trágica armadilha invocada ainda no governo Itamar: o Plano Real. Esta armadilha consiste basicamente do fetiche ao próprio plano, num jogo de espelhos endiabrado. A pergunta que eu faço é essa: qual é o plano do Real, qual é sua força motora, e em que termos se mantêm?

O Real foi implementado com o objetivo primário de estabilização de preços. “Morte ao dragão!”, era o lema entoado como mantra a partir de Brasília. O Plano, uma elegante rasteira no componente inercial da inflação e nos indexadores herdados de planos frustrados, foi executado de forma magistral, passando quase sem dor pela sociedade brasileira. Qual outro país no mundo poderia operar, num mesmo dia, com três moedas diferentes em circulação (Cruzeiro Novo, URV e Real), sem entrar em convulsão monetária?

Uma vez implementado, o Real precisava de uma âncora, que prontamente foi fornecida: o câmbio. Mas o que é uma âncora? Estamos ancorando o que? E porque é tão importante a estabilização de preços? Vou começar pela última. A estabilização de preços é importante pois a moeda é fiduciária numa economia moderna, ou seja, uma moeda que perde seu poder de realizar-se em mercadoria mensalmente, em taxas muito altas, denúncia a fragilidade do estado que lastreia essa própria moeda. Penaliza o pobre que não consegue se defender do dragão, que deveria ser combatido, numa sociedade civilizada, pelo próprio estado que, no nosso caso, perdeu a credibilidade, deixando o miserável ao deus-dará.

Estamos ancorando o que? Respondo: um estado que faz água sem parar e está a deriva, pois não encontra consistência interna nas suas contas, devido as contradições da sua própria formação. A Constituição atrapalha (engessando o orçamento), a Previdência sufoca (em parte por sua má administração, em parte pela insistência das pessoas em envelhecerem), a política desanda (por nossa pobre tradição democrática e das nossas gentilezas tradicionais); entre tantos motivos, uns concretos, outros quase esotéricos.

Agora a primeira. O que é uma âncora? Uma âncora, meu caro Watson, ancora. Simples assim. Mas, ancora o quê? E por quê? A economia capitalista é um turbilhão. Todo dia a todo segundo, vende-se, compra-se, empresta-se, revende-se, leiloa-se; enfim, um sem fim de transações acontecem simultaneamente, simulando valores de uso (ou de trabalho) em moeda. E esta moeda, como disse, é o próprio Estado garantindo a validade da transação. Já que na inflação a moeda perde seu papel, fica a cargo da âncora fixar um ponto neste mar bravio, o qual todos os agentes econômicos (empresários, trabalhadores, bancos...) têm como Norte. Não importa o que acontecer, o estado garante que ali, naquele ponto, haverá estabilidade. Com isso espera que o selvagem oceano se comporte ao estabelecido ponto estacionário.

Só que estabilidade custa caro para quem está indo a pique. O estado gastou fábulas para manter o câmbio estável, captando dólar com uma taxa suicida de juros, através de aplicações de curto prazo de “investidores” “estrangeiros”. Chegamos até a deselegância de estabelecer uma banda diagonal endógena da taxa de câmbio, pura bruxaria econômica, na tentativa desesperada de manter o porto seguro dolarizado.

Com a flexibilização do câmbio outra âncora se fez necessária. E esta é fantástica, digna de menção honrosa. Agora a âncora que dá credibilidade a moeda é o próprio índice da variação da mesma. Ou seja, a inflação é guardiã de si própria através de um índice futuro desejado dela; o famigerado inflation target.

Mas, o que seria de uma âncora sem uma forte corrente prendendo-a ao barco? Em ambos os casos nos valemos da poderosa corrente da taxa de juros. O Real está desvalorizando? Aumenta os juros para entrar dólar! Estamos saindo do core da meta de inflação? Manda o BC reprimir o consumo com os juros reais mais altos do planeta! E do que são feitos os elos desta épica corrente? Da nossa infindável dívida pública. Estamos tirando metal do barco para forjar a rigidez necessária a corrente, e, com isso, deixamos o casco, já furado, ainda mais frágil.

Juros são coisa futura. Presente mesmo é o Estado Brasileiro. Porém, se o barco não pára de fazer água, abrimos mão de uma consistente estabilidade por um futuro remediado. O pior é que um Estado endividado nem sempre é ruim (quem não o for, que atire a primeira pedra), ruim mesmo é endividar-se por desespero. O Brasil não investe sua dívida, ele aplica.

E este é o bizarro Plano do Real. Um plano estéril de futuro, justamente porque o futuro esta acorrentando (e acorrentado) um barco que não tem prumo nem rumo. FHC fez o milagre, mostrou o santo e deixou a penitência para Lula, que navega desacordado num barco fantasma. E la nave va!

André Perfeito